Venho aqui deixar-vos um album fantástico de uma das bandas mais reveladoras que vi nos últimos anos ao vivo. Foi o concerto de encerramento do Castelo do Festival de Músicas do Mundo em Sines e foi certamente dos melhores momentos daquele festival.
Os Staff Benda Bilili (traduzindo para português: olhem para além das aparências) são um conjunto de músicos de rua de Kinshasa no Congo. Grande parte eram sem abrigos, 5 são vítimas de poliomielite, condicionados pela doença à cadeira de rodas ou muletas e discriminados tanto no quotidiano como no meio musical pela sua deficiência motora. Contam que não eram contratados para tocarem em bandas locais porque não conseguiam dançar...
Os restantes 3 eram
sheges, vulgo miúdos de rua, classe social muito abundante no Congo, a quem era frequente as guerrilhas oferecerem armas de fogo e serem utilizados como soldados-crianca de baixo custo nas guerras civis (a última terminou em 2003), entretanto acolhidos e educados pelos membros mais velhos da banda que se costumam deslocar pela cidade em triciclos adaptados.
Embora tenham tido a ajuda do famoso produtor belga Vincent Kenis, por falta de recursos tiveram que gravar o albúm no Jardim Zoológico de Kinshasa!
Aqui podem ver o vídeo da canção Polio filmado nessa localização, reparem no background sonoro, bastante singular.
Queriam ser reconhecidos como a melhor banda de deficientes motores de África, mas conseguiram muito mais. Tornaram-se um verdadeiro fenómeno local e nas comunidades francófonas e em 2009 foram galardoados com o prémio Womex para a melhor banda de World Music do Mundo.
Apesar da mobilidade reduzida dão um espéctaculo fascinante, que pôs o castelo berço de Vasco da Gama num contínuo estado de euforia.
Os pontos altos do concerto foram para mim:
- os solos do jovem Roger Landu de 19 anos no seu
satonge, um instrumento construído pelo próprio, utilizando um fio, um bocado de madeira dum cesto e uma lata perfurada com uma sonoridade muito própria;
- a presença de Kabamba Kabose Kasungo, que passou o concerto todo amparado nas suas muletas e a dançar qual Thom Yorke enfeitiçado. A força deste homem é incrível, até o vi a saltitar numa perna!
- e claro o 5º vocalista e dançarino de serviço, Djunana Tanga-Suele (demorei um tempinho a encontrar os nomes destes 3 senhores), que em vez de pernas tem pequenos cotos, e que passou o concerto inteiro a sorrir para a plateia. Às tantas saltou da cadeira de rodas e começou a dançar no chão e a dar cambalhotas pelo palco! Talvez o momento singular mais glorioso de todas as actuações que presenciei no festival!
Foi certamente a banda com energia mais positiva que já vi! De várias actuações ao vivo que tenho visto na net, posso concluir que este concerto deverá ter sido dos mais a abrir e com a banda a responder melhor ao público, o que é fácil de explicar pelo ambiente fantástico que existe neste festival.
Este vídeo do youtube ilustra isso mesmo, e apesar da qualidade não ser a melhor, percebe-se que o público adorou a prestação e dedicação da banda.
Após ter chegado a casa, fui à procura de mais informações sobre a banda e fiquei bastante impressionado com
este artigo do Guardian, que retrata o quotidiano da banda numa altura em que já eram conhecidos e começaram a sua digressão pela Europa. As condições de vida descritas são ainda mais deploráveis do que imaginava, e espanta-me a alegria verdadeiramente contagiante que estas pessoas têm tanto no palco, como no dia-a-dia!
Das poucas coisas que me entristeceram foi o facto de não ter ficado na 1ª fila e de não ter visto o documentário sobre a banda! BL, não arranjarás isso por intermédio da organização do festival?
Já agora, fica aqui também outro pedido aos participantes do blog:
Tenho estado à procura do album homónimo dos N'Diale - Jacky Molard Quartet e Foune Diarra Trio, mas por enquanto sem sucesso. Só o encontrei no
Itunes e no Napster...Este projecto, criado a partir da fusão de um dos melhores violinistas franceses, Jacky Molard (que já viera a Sines com o seu quarteto em 2007), e pelo trio da vocalista Foune Diarra, mistura sonoridades celtas da Bretanha com os sons africanos do Mali. Instrumentalmente, deram talvez o melhor concerto do Festival, parte do qual podem ver a partir dos 3:24
deste vídeo. A música Deme foi para mim o ponto alto instrumental do festival e a conclusão do concerto com a vocalista a dançar de maneira muito exuberante levou o recinto verdadeiramente à loucura.
Portanto se encontrarem o album algures nas redes imensas do ciberespaço, postem aqui, terão o meu enorme agradecimento!